Barroso fez discurso político na Universidade do Texas, em fevereiro de 2022. Proibida constituição, o ministro do STF atacou até mesmo a política econômica de Paulo Guedes, com frases irônicas ao seu desempenho no governo
O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Luís Roberto Barroso, é reincidente em casos polêmicos que envolveram críticas diretas ao ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). Antes de subir ao palanque do 59º Congresso da União Nacional dos Estudantes, em Brasília, onde afirmou “Nós derrotamos o Bolsonarismo”, o mesmo magistrado já havia participado de evento na Universidade do Texas, em Austin, onde palestrou como convidado sobre o tema “Como se livrar de um presidente”: o Retrato do Poder Executivo na América Latina. O discurso pode ser assistido neste link.
O ativismo de Barroso foi coberto pela imprensa e chegou a ser criticado pelo senador Lasier Martins (Podemos-RS), que apontou “crime de responsabilidade. Já Luís Roberto Barroso usou o site do STF para se defender.
“Cumprindo o cansativo dever de restabelecer a verdade diante de mentiras reiteradamente proferidas, o gabinete do Ministro Luís Roberto Barroso informa que ele jamais proferiu palestra no exterior sob o título “Como se Livrar de um Presidente”. Em evento realizado na Universidade do Texas, a palestra do Ministro foi sobre “Populismo Autoritário, Resistência Democrática e Papel das Supremas Cortes”, justificou o portal do STF.
Embora o tema de seu discurso não tenha sido propriamente “como se livrar de um presidente”, o conteúdo de sua palestra não teve nenhuma relação com a Suprema Corte ou com direito constitucional. A maior parte do texto apresenta críticas sobre economia, política e acusações contra o Governo Bolsonaro.
“Nenhum dos expositores sequer tocou no tema de eventual impeachment do atual Presidente do Brasil”, apontou Barroso por meio de nota.
“Vários fatores levaram ao avanço do populismo de direita em vários países, incluindo Estados Unidos, Grã-Bretanha (Brexit) e Brasil. É possível sistematizar esses diferentes fatores em três categorias: político, econômico-social e cultural-identitário”, afirmou Barroso, na abertura de seu discurso, todo feito em inglês.
O nome de Jair Bolsonaro aparece ao longo dos primeiros cinco minutos das falas do ministro, logo após anunciar que analisaria o processo histórico do “populismo extremista” que “impactou o Brasil”.
“Em 1º de janeiro de 2019, Jair Bolsonaro assumiu a presidência após derrotar Fernando Haddad, do Partido dos Trabalhadores, obtendo quase 58 milhões de votos. “O presidente eleito se apresentou como candidato anti-establishment, apesar de ter sido deputado federal por sete mandatos, entre 1991 e 2018. Seus três filhos mais velhos também tiveram carreira política. Apesar da ironia, não é incomum que membros da tradicional elite política, econômica ou empresarial se apresentem como “verdadeiros” representantes do povo”, criticou Barroso, comparando Bolsonaro ao ex-presidente norte-americano Donald Trump.
“Donald Trump, um ícone populista, é um herdeiro bilionário que frequentou algumas das mais famosas universidades americanas.
Barroso critica “ascensão de Bolsonaro”
Logo após o preâmbulo, Luís Roberto Barroso dedicou praticamente ao ex-presidente Bolsonaro, não poupando críticas a seu governo, inclusive ao então ministro da Economia, Paulo Guedes. Antes de mirar em seu alvo, Barroso analisou o processo de impeachment de Dilma Rousseff, atacando o objeto do processo que a tirou do cargo e destacando “acusações de corrupção” contra Michel Temer.
“A presidente Dilma Rousseff foi afastada definitivamente pelo Senado Federal em 31 de agosto de 2016. A justificativa formal foi um “crime de responsabilidade” apelidado de “pedalada fiscal” – que, em poucas palavras, é uma violação das leis orçamentárias –, embora o verdadeiro motivo tenha sido sua perda de apoio político”, comentou.
“O vice-presidente Michel Temer assumiu o cargo até o final do mandato presidencial. (Seu sucesso, no entanto, foi prejudicado por sucessivas denúncias de corrupção contra ele”, o
Na sequência da abordagem, Luís Roberto Barroso fez uma breve abordagem sobre os escândalos de corrupção que se espalharam pelos governos petistas, inclusive o Petrolão, cujo ápice foi a condenação e eventual prisão de Luiz Inácio Lula da Silva. Antes de chegar a Jair Bolsonaro, o ministro lamenta o fato de que o Brasil havia subido e caído de status tão rapidamente.
“Em 2009, o país sonhava que o futuro havia chegado, com indicadores extremamente favoráveis, que levaram até a revista The Economist de 12 de novembro de 2009 a comemorar a decolagem e a perspectiva de o Brasil se tornar a quinta maior economia do mundo. Isso não aconteceu. Em 24 de setembro de 2013, quatro anos depois, a mesma revista noticiou que o Brasil, mais uma vez, havia desperdiçado uma chance. A queda foi traumática”, lamentou. Em seguida, Barroso levantou o tom sobre o sucessor Temer no Planalto.
Ministro do STF ironiza Paulo Guedes
Depois de apontar, segundo Barroso, todas as características negativas de Jair Bolsonaro, o ministro do STF abordou o perfil do ministro da Economia, Paulo Guedes. Assim como nos tópicos anteriores, não há qualquer embasamento jurídico, apenas político – prática vedada pela Constituição.
“Foi nesse contexto que surgiu e tomou forma a improvável candidatura de Jair Bolsonaro”, pontuou Barroso. “Político que nunca esteve no mainstream ou no centro dos processos decisórios, ficou conhecido por discursos e visões retóricas radicais, como a defesa da ditadura militar brasileira, a tortura e a declaração de que, se possível, ele atiraria no ex-presidente Fernando Henrique Cardoso.”, criticou.
“Para promover sua agenda contra o big state, nomeou o economista Paulo Guedes, formado pela Universidade de Chicago, que tinha a promessa messiânica de resolver todos os problemas da economia brasileira”, ironizou.
“Essa agenda também não durou”, avaliou o ministro. “Embora Paulo Guedes permaneça no cargo e tenha aprovado com sucesso uma importante Reforma da Previdência, ele não conseguiu aprovar outros projetos importantes relacionados à responsabilidade fiscal e privatizações. E por ter cedido às demandas do presidente Bolsonaro em certas ocasiões, contrariando a agenda menor do estado, houve inúmeras renúncias de importantes integrantes de sua equipe ministerial”, completou Barroso, finalizando a fala com uma citação em tom de sarcasmo.
“Quanto à suposta agenda de superação da velha política, o presidente aliou-se ao tradicional Centrão, o bloco mais tradicional da política brasileira, conhecido por sua voracidade por cargos políticos e verbas públicas”, destacou.
“Como disse Stephen Holmes, de fato, “a democracia é feita de promessas, enganos e gerenciamento de enganos”, decretou Barroso.
Barroso chama Bolsonaro de “ameaça”
A parte final da palestra de Barroso foi totalmente dedicada aos ataques ao “estado democrático de direito” – tema inserido em inúmeros decretos no Supremo Tribunal Federal. Muitos indiciados, inclusive, sequer tiveram acesso aos autos e não sabem os motivos das acusações após mais de quatro anos.
“Bolsonaro foi eleito seguindo a tradicional cartilha populista… Inevitavelmente, logo surgiu o conflito que caracteriza a relação entre populismo e democracia: não há como cumprir promessas de campanha sem trabalhar com as instituições supostamente ocupadas pelas elites”, observou Barroso.
“Na prática, o discurso anti elite acaba degenerando em um discurso antidemocrático, anticientífico e anti-empreendedorismo. Os ataques às instituições brasileiras partiram articuladamente de sites, blogs e canais da extrema-direita, pregando invasão e fechamento do Congresso Nacional e do Supremo Tribunal Federal, com a retirada forçada de seus integrantes”, avaliou o ministro, antes de acusar Bolsonaro de participar e incentivar práticas antidemocráticas.
“A participação do presidente em manifestações antidemocráticas gerou preocupação até mesmo em setores que o apoiavam politicamente”, afirmou Barroso.
“Os exemplos se multiplicaram, com o comparecimento a manifestação na porta do quartel-general do comando do Exército, durante a qual se exigia o retorno da ditadura militar (…) Desfile de tanques de guerra na “Praça dos Três Poderes” com clara finalidade intimidatória, e mudança do diretor-geral e dos superintendentes da Polícia Federal para atuarem de forma independente e conduzirem investigações que o Presidente pretendia barrar”, acusou Barroso, sem apresentar provas.