Como Joe Bennett e Luciano Cunha – dois dos artistas mais conceituados do universo geek nacional – superaram adversidades e se uniram para salvar o Brasil da hegemonia woke
Em 2011 – quando o Brasil sequer ensaiava o retorno da direita ao poder – o professor Olavo de Carvalho já alertava para a importância de competir em condições de igualdade com o regime que passou a governar o país a partir de FHC e praticamente se perpetuou com as diretrizes empregadas em 5 gestões petistas.
“O governo militar se ocupou de combater a guerrilha, mas não de combater o comunismo na esfera cultural, social e moral (…) O primeiro passo para marginalizar uma corrente de ideias é excluí-la da alta cultura. (…) uma parte da esquerda foi para a guerrilha, mas a maior parte dela se encaixou no esquema pregado por Antonio Gramsci, que é a revolução cultural, a penetração lenta e gradual em todas as instituições”, explicou.
As sempre cirúrgicas análises de Olavo de Carvalho – não importa quão antigas – não só permanecem visionárias, como oferecem um retrato vivo do cenário nacional e internacional – hoje, infestado pelas influências identitárias.
No Brasil, em específico, já é visível a consolidação de artistas que não somente se recusam a serem dominados pelo que hoje é definido como “cultura woke”. Melhor: apesar de sofrerem os efeitos da praga do cancelamento, nomes como de Luciano Cunha e Benedito José Nascimento – o quadrinista paraense que conquistou fama como Joe Bennett – explicam como a diversidade serviu de combustível para inspirar uma nova geração criativa que se recusa a deixar nas mãos dos progressistas o leme cultural.
Na estrada desde 1985, Joe Bennett vestiu a capa dos heróis especialistas em quadrinhos, com atuações definitivas na DC Comics e Marvel – posto que ocupou até 2021, quando o discípulo de gênios como Sal Buscema e Jack Kirby era responsável por desenhar a série de HQs “Hulk Imortal”.
Sua saída da gigante em 2017 – hoje, sob comando da Walt Disney Company – o levou para a Arkhaven Comics, onde o ilustrador garante ter se libertado das garras do cancelamento, após ter sido acusado de “antissemita” pelo autor norte-americano Al Ewing.
Dois anos após a “emancipação forçada”, provocada por uma homenagem tirada de contexto feita aos judeus como especialistas em joias (além de uma infundada ligação com Jair Bolsonaro), a parceria com o lendário Chuck Dixon para compor a HQ independente Alphacore, colocou o brasileiro em um outro patamar na guerra cultural.
“A grande novidade é o sucesso da revista Alphacore, que ilustrei para a Rippaverse”, revela Bennett. “Ela foi produzida por meio de um crowdfunding e já vendeu mais de 30 mil exemplares, faturando US$ 1,5 milhão”, comemora.
Ignorado pela grande mídia, Joe Bennett diz que não se incomoda mais com o verdadeiro shadow ban imposto pelo sistema – uma intolerância que culminou com a expulsão de seu próprio editor, Eric July, da badalada Comic Con de San Diego no ano passado. Mais uma vítima da cultura woke.
“Eles me ignoram, mas eu também não aceitaria certos convites”, reitera Bennett. Eu já neguei até entrevistas para o Amaury Júnior. É uma guerra cultural real e que só começou. Os artistas de direita mal entraram no campo de batalha. Eles (a esquerda) dominam isso há muitos anos. Bora ver quem é que quebra”, reflete.
Sobre as intrincadas trincheiras culturais, Joe Bennett afirma que está pronto para colaborar com o avanço conservador em uma convenção inédita que deve acontecer entre o final de julho e início de agosto na capital paulista.
“Um dia essa história será revisitada – a de eu ser chamado de antissemita. Mas será Deus quem irá dizer. Estou trabalhando mais do que nunca – e hoje ganho até mais do que ganhava na época. Louvado seja Deus por isso. Tudo foi feito de acordo com a determinação do Senhor”, celebra Joe Bennett, resignado.
“Ironicamente, eles (a esquerda) são os que mais atacam os judeus hoje com declarações reais antissemitas”, conclui.
Luciano Cunha: “Me ignoram porque não votei no Lula”
Amigo particular de Joe Bennett, o carioca Luciano Cunha debutou no universo dos quadrinhos em 1988, graças à oportunidade de trabalhar com Ziraldo no gibi do Menino Maluquinho – um dos maiores hits nacionais do segmento.
O auge de Cunha veio à tona duas décadas mais tarde com a chegada de O Doutrinador – o anti-herói da máquina de gás com olhos vermelhos cintilantes, com uma aura inspirada por “Batman – Cavaleiro das Trevas” – o clássico de Frank Miller da DC Comics.
A escalada de Cunha e sua criatura atingiu o ápice com o longa-metragem protagonizado pelo Doutrinador em 2018, em uma produção da Downtown/Paris Filmes, estrelada por Kiko Pissolato, Natália Lage e Edu Moscovis.
Sua empreitada na sétima arte, com qualidade hollywoodiana, o inspirou a desenvolver mais personagens com aura conservadora. Entre eles, o Destro, que atraiu centenas de milhares de downloads no portal da norte-americana Arkhaven.
O sucesso avassalador de Cunha, entretanto, não parece ter agradado quem domina a cultura pop contemporânea. Sim. Assim como Joe Bennett, o autor tem sido esnobado por convenções, eventos e entrevistas em outlets da mídia tradicional.
“Atualmente, negocio com produtores brasileiros que moram nos EUA, mas nada sólido por enquanto”, explica Cunha. “No entanto, as hqs de O Doutrinador e Destro possuem mais de 600 mil downloads no portal da Arkhaven, uma plataforma dos EUA que expõe quadrinhos. Eu, um brasileiro, sou o cara mais lido na plataforma – que tem quase 3 milhões de views”, revela.
Embora tenha convivido com o sucesso há mais de 15 anos, Luciano Cunha lamenta não ser lembrado no Brasil em grande escala. Ele cita o desempenho de seu personagem mais famoso nas telas internacionais como o fator mais intrigante.
“O filme O Doutrinador foi lançado em 11 países. Só por aí eu deveria ser lembrado”, pondera.
“Não existe nenhum convite para eventos no Brasil porque eles sabem que não votei no Lula. Apesar de eu nunca ter declarado apoio algum a Jair Bolsonaro, sem ter sequer uma foto com ele ou com algum de seus filhos, eu simplesmente fui banido de qualquer espaço geek”, racionaliza Cunha.
Diversidade “Woke” ou Qualidade?
Luciano Cunha e Joe Bennett não têm apenas em comum o talento e o sucesso profissional. Ambos comungam da teoria que o mercado tradicional de HQs e filmes de super-heróis perderam seu antigo espaço pela imposição de regras que priorizam a chamada prática de lacração.
O que o consumidor jovem de cinema e quadrinhos talvez não tenha percebido é que a diversidade sempre foi o carro-chefe de editoras como Marvel e DC. Nomes como os X-Men, por exemplo, nasceram em 1963 como porta-vozes da luta pela inclusão de pessoas com características diferentes da maioria.
A grande diferença lá atrás – segundo Luciano Cunha – foi que eles conquistaram sua fama “pela qualidade dos roteiros, e não pela ditadura da diversidade”.
“O mundo dos quadrinhos sempre teve muita diversidade, grandes personagens indígenas, negros, femininos – e até mesmo, anões”, lembra Luciano Cunha.
“Só que antes isso não era imposto. Vinha de forma natural e era muito bem aceito. Agora é como se fosse uma regra. Não fica bem. Nada que é imposto é bom. Essa prática passou a ser a razão da história – essa lacração. O roteiro ficou em segundo plano. As histórias hoje são muito ruins. O mercado norte-americano está em colapso e os mangas japoneses estão tomando o lugar das HQs, lamenta o fã de nomes que traçaram seu destino no segmento. Entre eles, os imortais Stan Lee e Jim Steranko.
“Já faz uns 10 anos que isso acontece, e o mercado parece não se importar em perder dinheiro”, ressalta.
Joe Bennett reforça a análise do parceiro geek, pontuando a riqueza de diversidade que a criação de Jack Kirby e Stan Lee começou a proporcionar aos leitores no início da década de 1960 – anos-luz antes de qualquer movimento que tenta aplicar lavagem cerebral cultural aos leitores.
“Sempre houve diversidade nas HQs. Eu era moleque de 12 anos e achava muito interessante ver uma escola onde tinha uma africana, um russo, um cara que tinha aparência de demônio mas era um católico devoto. Esses eram os X-Men”, exalta Bennett.
“Hoje tudo está mal escrito. Eles querem a diversidade, mas as ideias são ruins. A diversidade era usada antes como pano de fundo para exaltar a lealdade e a amizade. E hoje isso tudo foi esquecido”, ressalta o autor que não se cansa de exaltar suas próprias origens indígenas, traduzidas em Açu, um de seus personagens oriundos de nossa floresta amazônica.
“Os quadrinhos precisam ter uma mensagem. Mas, em primeiro lugar, ele precisa ter uma boa história e uma boa arte. Eles devem priorizar a diversão”, reforça.